terça-feira, 22 de setembro de 2009

Esquema do texto de Geertz


Oi, pessoal, eis o esquema do texto do Geertz, que estaremos trabalhando nas aulas de 14, 16 e 23 de setembro:

GEERTZ,Clifford. (1989) “A religião como sistema cultural” In: A interpretação das culturas. Rio de Janeiro:Guanabara. Capítulo 4, pp. 101-142. [1ª. ed. do artigo é de 1966, do livro é de 1973]

1. Autor: Clifford Geertz (1926-2006)
- Após participar da 2ª. Guerra Mundial, é beneficiado pela lei que permite aos ex-combatentes cursar a universidade e inicialmente estuda literatura. Acaba por voltar-se para a antropologia e se torna um dos mais importantes antropólogos do século XX, tendo publicado cerca de 20 livros e realizado pesquisas etnográficas na Indonésia, no Marrocos e em Bali. Sua obra mais conhecida é a coletânea de artigos The Interpretation of Cultures, publicada em 1973 e na qual ele propõe uma antropologia hermenêutica ou interpretativa visando alcançar a “descrição densa” de uma cultura, vista como um texto a ser interpretado em busca do significado.

2. Obra (texto) : o artigo em questão faz parte da obra referida acima, mais especificamente da terceira parte, dedicada a estudos de religião. Foi publicado pela primeira vez em 1966.

3. Estrutura do texto

0. Epígrafe: Santayana e a religião como um novo mundo em que viver

I. (101-103) Levantamento da questão: as insuficiências da antropologia religiosa atual e uma proposta de trabalho (estudar a “dimensão cultural da análise religiosa”)
- Crítica à estagnação teórica da antropologia religiosa pós II GM: repetição dos clássicos e falta de interdisciplinaridade
- A proposta de Geertz: trabalhar a “dimensão cultural da análise religiosa”
- Definição de cultura (como sistema simbólico)
- Avanço irá dar-se na medida em que se definirem “significado”, “símbolo” e “concepção”

II. (103-140) A definição de religião, a explicação e exemplificação dos componentes deste sistema
- O paradigma inicial: símbolos sagrados sintetizando o ethos de um povo
- A definição de religião:
“(1) um sistema de símbolos que atua para
(2) estabelecer poderosas, penetrantes e duradouras disposições (moods) e motivações nos homens
p.105 através da
(3) formulação de conceitos de uma ordem de existência geral e
(4) vestindo essas concepções com tal aura de fatualidade que
(5) as disposições (moods) e motivações parecem singularmente realistas.”

- ... um sistema de símbolos que atua para...
 definição de símbolo
 definição de padrões culturais (como fontes extrínsecas de informação)
 modelo de e modelo para
 o homem como animal simbólico (só ele elabora modelos da realidade)
- ... estabelecer poderosas, penetrantes e duradouras disposições (moods) e motivações (motivations) nos homens através da...
 Definição de moods (variam em intensidade, não induzem a nada, são analisadas em termos das suas fontes)
 Definição de motivations (são “qualidades vetoriais” tem um “molde direcional”, analisadas em termos dos seus fins)
 Ex: Dizemos que uma pessoa é diligente porque visa ao sucesso; dizemos que uma pessoa está preocupada porque tem consciência da ameaça de um holocausto nuclear.”

... formulação de conceitos de uma ordem de existência e...
 As duas dimensões dos símbolo religiosos estão inextrincavelmente ligadas, eles só induzem a um ethos (moods e motivations) porque colocam estas disposições num arcabouço cósmico
 Sem os símbolos e os sistemas simbólicos, o homem seria acometido de uma “grave ansiedade” gerada não só pela falta de interpretações mas de interpretabilidade; este caos ameaçaria o homem em três pontos:
i. “limites de sua capacidade analítica” (perplexidade)
ii. “limites de seu poder de suportar” (sofrimento)
iii. “limites de sua introspecção moral” (sentido de paradoxo ético obstinado [i.e. injustiça] )
 Os três desafios propostos pela experiência (perplexidade, sofrimento e paradoxo ético) geram “a suspeita inconfortável (sic) de que talvez o mundo, e portanto a vida do homem no mundo não tenha de fato uma ordem genuína qualquer – nenhuma regularidade empírica, nenhuma forma emocional, nenhuma coerência moral.”
 A religião vai ser uma resposta a este tríplice desafio, sempre da mesma forma: “a formulação, por meio de símbolos, de uma imagem de tal ordem genuína do mundo, que dará conta e até celebrará as ambiguidades percebidas, os enigmas e os paradoxos da experiência humana.”
 Ou seja, a religião afirma, ou ao menos reconhece: “a inescapabilidade da ignorância, da dor e da injustiça no plano humano” - “enquanto nega, simultaneamente, que essas irracionalidades sejam características do mundo como um todo.”

... e vestindo essas concepções com uma tal aura de fatualidade que...
 Como se chega a acreditar ? A QUESTÃO: “De que maneira um homem religioso muda de uma percepção inquieta de desordem experimentada para uma convicção mais ou menos estabelecida de ordem fundamental ? O que significa exatamente a crença num contexto religioso ?”
 “a crença religiosa não envolve uma indução baconiana da experiência cotidiana – do contrário, seríamos todos agnósticos – mas, ao contrário, uma aceitação prévia da autoridade que transforma essa experiência.”
 “O axioma básico subjacente naquilo que poderíamos talvez chamar de ‘perspectiva religiosa’ é o mesmo em todo o lugar: aquele que tiver de saber precisa primeiro acreditar.”

as disposições (moods) e motivações parecem singularmente realistas
 A perspectiva religiosa e suas diferenças em relação às perspectivas do senso comum, da ciência e da estética
 A definição de ritual (comportamento consagrado) e seu papel: operar a fusão do mundo vivido e do mundo imaginado, transformando o sentido de realidade
 A experiência religiosa como um exemplo de salto entre as províncias finitas de significado (Schutz); o caso do Bororo que se diz um periquito, o que isso significa em termos de uma perspectiva religiosa e em termos de uma perspectiva do senso comum e como a primeira altera e influencia a segunda
 Se a imbricação entre religião e senso comum é geral, o conteúdo é particular, varia de cultura para cultura, de religião para religião; não é possível fazer “uma avaliação geral do valor da religião em termos tanto morais quanto funcionais.”

III. (140-142) Conclusões e questões metodológicas :
- A importância da religião para o antropólogo: um modelo da atitude e um modelo para a atitude
- “O estudo antropológico da religião é, portanto, uma operação em dois estágios:”
i. “uma análise do sistema de significados incorporados nos símbolos* que formam a religião propriamente dita”
ii. “o relacionamento desses sistemas aos processos sócio-estruturais e psicológicos.”

4. Objetivo do texto (do artigo):
- Trata-se de uma proposta de renovação dos estudos antropológicos sobre a religião, que leve em conta não somente o relacionamento entre a religião e processos sócio-estruturais e psicológicos mas tenha como ponto de partida o estudo da religião como sistema simbólico.

5. Palavras-chave (ou conceitos centrais)
- Sistema
- Religião
- Símbolo
- Ethos
- Visão de mundo
- Moods
- Motivations
- Dispositions
- Padrões culturais
- Modelo de
- Modelo para
- Ritual

6. Métodos
- Depois de brevemente apontar uma lacuna na bibliografia, propõe uma nova definição de religião dividida em seis partes e passa a utilizar exemplos etnográficos das mais diversas origens para tentar explicitar e esclarecer melhor a sua definição.



7. Fontes utilizadas
- Material etnográfico variadíssimo, proveniente sobretudo de outras pesquisas de antropologia da religião. Alguns insights e conceitos do texto são provenientes de outras áreas do conhecimento, como a filosofia (S.Langer) e os estudos literários (K.Burke).

8. Conclusões do texto
- Ver item III da estrutura do texto acima.

9. Questões e críticas:
- As principais críticas à obra de Geertz em geral foram resumidas por Aletta Biersack (In: HUNT, Lynn (Org.) (1992). A nova História Cultural. São Paulo, Martins Fontes, pp.105-111):

i. "A falta de rigor metodológico de Geertz e os dilemas epistemológicos da estrutura original, a hermenêutica, deixa a análise cultural vulnerável aos céticos, que permanecem 'alérgicos', como disse Geertz 'a tudo que seja literário ou inexato'. Dada a natureza qualitativa da análise cultural, quais são as garantias de controle de qualidade oferecidas por Geertz além daquelas de seu próprio talento prodigioso ?”
ii. 'A incapacidade da teoria interpretativa de oferecer critérios para a avaliação de interpretações diferentes ou de paradigmas diferentes coloca um gigantesco obstáculo a suas pretensões de superioridade teórica'
iii. 'A tendência da descrição densa e da semiótica é de fortalecer impulso de esconder-se e de não tentar ligar as coisas. Isso acontece por aquilo que é uma força analítica - a atenção de Geertz à particularidade e o fato de ele voltar-se para a perspectiva do ator - constitui uma fragilidade em termos de síntese. A descrição densa leva a brilhantes leituras de situações, rituais e instituições, isoladamente. Não requer que se diga de que maneira os 'textos culturais' se relacionam uns com os outros ou com os processos gerais de transformação econômica e social.'
iv. "... a análise cultural de Geertz é tão estática quanto qualquer estruturalismo."
v. 'As culturas são teias de mistificação, bem como de significação. Precisamos perguntar quem cria e quem define os significados culturais, e com quais finalidades.' (...) 'mantém-se particularmente silencioso sobre o modo pelo qual os significados culturais sustentam o poder e o privilégio.'

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